domingo, novembro 19, 2006

[ grande sertão: veredas ]

Mesmo que você não conheça ainda ou que não pretenda ler isso agora, baixe a versão em pdf do clássico Grande Sertão: Veredas, um dos maiores romances da língua portuguesa, em vários sentidos, escrito pelo João Guimarães Rosa, mineiro falecido em 1967. Como disse o professor Luís Augusto Fischer, é um livro exigente, também é um presente fabuloso. A versão estará disponível, de forma gratuita, até dezembro.

[ 27ª bienal de são paulo ]

Pergunta pertinente: desde quando isso á arte?

sábado, novembro 18, 2006

[ sonho de uma noite de verão ]

Semana passada, fui assistir à peça Sonho de uma noite de verão, de William Shakespeare, com direção da Patrícia Fagundes em montagem da sua Cia Rústica, e não me decepcionei. Eu já tinha escutado muitos elogios pra montagem, o que às vezes é um problema.

A peça é linda, sexy e divertida. Como o próprio release do site aponta, a montagem está situada em uma atmosfera de cabaré, o que pode ser considerado uma ousadia. Mas Patrícia acertou a mão, e ninguém sai insatisfeito da apresentação, o que aconteceu com outra montagem sua de Shakespeare, Macbeth, Herói Bandido. Mesmo assim, é de tentativas como essas que o teatro gaúcho precisa, algo que já comentei a respeito da montagem de Hamlet, do Luciano Alabarse.

Sonho de uma noite de verão ficou o ano inteiro em cartaz, mas acredito que deve retornar aos palcos no Porto Verão Alegre. Quem quiser ficar antenado, pode acompanhar a agenda do grupo, que incomoda um pouco por não ser regressiva quanto aos meses, apenas quanto aos anos.

Mas voltando aos comentários, parece que está virando moda atores executarem a trilha sonora no palco. E esse é outro trunfo da peça. O elenco, apesar de jovem, tem garra pra cantar as canções que foram elaboradas por Marcelo Delacroix e Simone Rasslan, com intervenções do grupo e da diretora. Além disso, as coreografias também são exigentes, mas apresentadas com muita beleza. A vontade que dá é de sair dançando junto com o grupo...

Também pretendo assistir logo à Mamãe foi pro Alaska, peça baseada em True West, do Sam Shepard, com direção do Ramiro Silveira, que fica em cartaz aqui em Porto Alegre apenas até o final desse mês.

segunda-feira, outubro 30, 2006

[ little miss sunshine ]

O filme do ano. Pequena Miss Sunshine ou Little Miss Sunshine. Aliás, eu diria que é a comédia da década...

domingo, outubro 29, 2006

[ santa inês 60 anos ]


Um dos colégios onde trabalho, o Santa Inês, está comemorando 60 anos. Em sua homenagem, eu escrevi um artigo que saiu na revista do colégio e, na última quinta-feira, no caderno Petrópolis do jornal Zero Hora. Como eles fizeram uma edição no texto e cortaram um parágrafo meio inútil mesmo, resolvi postar o texto integral aqui.


Colégio Santa Inês
Há 60 anos o coração do Petrópolis
Prof. Marcelo Frizon

Saio de casa às 7h10min. A Av. Alegrete ainda está pouco movimentada. Apenas algumas poucas senhoras estacionam seus carros em frente à academia para praticar alguma atividade esportiva antes do trabalho. Caminho em direção à Av. Carazinho, que está tomada por trabalhadores descendo em direção à Nilo Peçanha ou subindo em direção à Protásio Alves. Alguns moradores estão varrendo as calçadas de suas
casas. Os armazéns já estão abertos, com um cheiro de pão quentinho se misturando à fumaça dos carros. Crianças e adolescentes caminham inocentes e alegres em direção a suas escolas. A sombra das árvores corta o sol surgindo no horizonte.

O que se vê, a esta hora da manhã, são pessoas que caminham desatentas ao encontro de seus destinos. Cada passo é dado com um objetivo, assim como os meus. Apesar do frio que agrava o sono que custou a ir embora, meu destino é uma sala de aula de um Colégio que está completando sessenta anos. As ruas por onde caminho transformaram-se radicalmente nesse período. Sinto que carrego em minha pasta muito mais do que provas, livros e materiais: carrego uma história que ajudo a construir.

Ao penetrar no Colégio, a agitação das conversas dos estudantes do Ensino Médio vai aumentando junto às brincadeiras das crianças do Ensino Fundamental. Essa percepção transforma-se numa sensação de vida. A cada bom dia que dou para meus colegas, observo que eles também sentem o mesmo que eu, também eles carregam uma história. Durante a oração, o calor das mãos apertadas leva embora o frio compartilhado até aquele momento. Mas a temperatura só fica agradável definitivamente quando entro na sala de aula.

Reconhecendo em cada rosto uma vontade diferente, faço minha chamada e cumprimento a turma que terá de encarar explicações e ensinamentos determinantes para sua formação. Mais do que um objetivo, estar ali diante desses adolescentes é uma necessidade. Não uma necessidade material ou financeira, mas uma necessidade física e sentimental, porque sei que aprenderei muito mais com cada um do que tudo aquilo que ensinarei.

Durante o recreio, no meio da manhã, a alegria do Colégio tem um sabor diferente. Nesse momento, sinto uma tristeza por um tempo que já passou e não é mais meu. O tempo é implacável, mas a sua passagem é fundamental. E para cada um dos jovens que está ali, na fila do bar ou no pátio ao sol, tem de ser assim. Antes de retornar para a sala de aula, vejo sempre alguma irmã contemplando os estudantes agitados com o final do recreio. É impossível sentir o que ela deve estar sentindo. Mas deve ser algo mais ou menos assim: o Colégio Santa Inês é o coração do bairro Petrópolis.

Costumam dizer que o Parque da Redenção é o coração do Bom Fim. É por ali que passeiam boa parte das famílias porto-alegrenses nos domingos de sol, apreciando as novidades do Brique e o chimarrão fumegando. Na verdade, talvez seja ali o coração da cidade.

Se é assim, se todo bairro tem seu coração, o Santa Inês é o coração do Petrópolis, pois é ali que se encontram amigos, colegas, casais de namorados, famílias inteiras. É ali que famílias se encontram em festividades mensais, sempre abertas a toda comunidade porto-alegrense. É ali que gerações já tiveram sua formação, é ali que a mãe estudou e também colocou o filho para estudar, assim como este fez com o seu filho, que é meu aluno. É ali que pulsa conhecimento, sabedoria, ensinamento. É ali que se firmam amores, amizades, relações eternas, duradouras, sinceras.

Ao voltar pra casa, no final da manhã, descendo desta vez a Av. Ijuí, tenho certeza de que é assim. Ou é como escreveu Vitor Ramil, no fundo, isso tudo é apenas o que meu olho inventa. “No tabuleiro rigoroso dessas ruas e na arquitetura minuciosa desses prédios a vida contemporânea explode em sua diversidade”.

Parabéns, Santa Inês!

terça-feira, outubro 03, 2006

[ maria bacana ]


Gostar de uma banda pouco conhecida é um problema gravíssimo. Aliás, gostar de um autor pouco conhecido também é, mas por mais desconhecido que seja esse autor ainda é mais fácil encontrar informações sobre ele e sua obra do que encontrar informações sobre uma banda pouco conhecida. Pelo menos é a minha sensação.

Eis que, navegando um pouquinho pela rede, acabo de encontrar o site da Maria Bacana, uma banda baiana que surgiu na segunda metade da década de 90. Eles fizeram um relativo sucesso na época, com clipe na MTV e cd lançado pelo selo RockIt!, do Dado Villa-Lobos. Fizeram alguns shows importantes, mas pouco tempo depois estavam desaparecidos. Pelo menos pra mim, que moro aqui na distante província de Porto Alegre, capital do ainda mais distante estado do Rio Grande do Sul.

O que importa é que a Maria Bacana andou separada por algum tempo e agora esses baianos estão retomando as atividades. Pra quem não conhece os caras, dá pra baixar muitas músicas no site deles, tudo de graça, inclusive o cd lançado pelo RockIt!, além de clipes e outras coisinhas legais.

A Maria Bacana faz um rock pesado mas com uma melodia suave, se é que isso é possível. Eu nunca vi uma banda com tanto peso e harmonia ao mesmo tempo. Normalmente as bandas de rock pesado não conseguem ser melódicas sem fazer aqueles vocais agudíssimos, tipo Angra, que eu acho uma droga. Mas felizmente existe a Maria Bacana e ela está de volta.

E agora vamos combinar o seguinte: todo mundo baixa o som deles, assiste aos seus clipes e começa a divulgar a banda, porque eles não podem mais retornar ao ostracismo. Mais do que isso: pelo que entendi, eles estão precisando de uma gravadora e de alguém que invista no seu potencial. Certamente essa pessoa vai ter lucro... Assim, quando eles vierem para Porto Alegre, estarei na primeira fila.

quinta-feira, setembro 28, 2006

[ sunken treasure ]


Sunken Treasure, o primeiro dvd do líder do Wilco, Jeff Tweedy, está para ser lançado em breve. Trata-se de uma compilação de apresentações acústicas em algumas cidades dos Estados Unidos. Definitivamente, um grande presente para o Natal... Só espero que seja lançado no Brasil também. Leiam mais informações aqui. E quem não conhece o Wilco está perdendo...

terça-feira, setembro 05, 2006

[ rango & charlote ]

A internet avançou muito nos últimos anos. Existem centenas de sites interessantes e muitos com ferramentas muito úteis para qualquer tipo de trabalho. Mas a verdade é que são poucos os sites realmente bons pra se passar o tempo. E um desses raros exemplos é o Rango e Charlote, fotonovela do meu amigo Guilherme Verzoni.

Conheci o Guiti no curso de Letras. Ele já tinha abandonado o Direito nessa época. Ele publicou um livro de contos divertido naquele ano, 1998, chamado A Barata de Toga. Alguns anos depois, 2000 ou 2001, lançou uma novela muito bem escrita e com uma trama bem construída, Uísque Bar no Litoral. Aí acabou largando definitivamente a Letras, fez uns cursos de Publicidade na ESPM e voltou pro Direito. Mas o grande negócio do Guiti é criar. A cabeça dele está sempre antenada para tudo a seu redor. Desde um clássico italiano da década de 40 até o último gibi do Robert Crumb, nada escapa. E pra criar é assim: só cria quem tem imaginação, e só tem imaginação quem lê muito, quem assite a muitos filmes, desenhos e seriados, quem escuta muita música, enfim, quem consome arte e devora antropofagicamente as informações do dia-a-dia.

Rango e Charlote é uma fotonovela, ou Ficções Fotonovélicas. É uma mídia pouco explorada na internet, talvez esta seja a primeira tentativa séria, pelo menos no Brasil. O texto é todo do Guiti, e pra produzir a história tenho a impressão de que ele contou com o apoio de alguns amigos e, claro, da RadioAtiva, pra pôr no ar o material. A linguagem da história é direta, sem papas e recheada com alguns neologismos, referência direta ao Laranja Mecânica do Anthony Burgess, adaptado pro cinema pelo Stanley Kubrick num filme fantástico. As cores lembram algo anos 60 ou 80. A trama retrata um casal em franca decadência, lidando com seres exóticos a procura de algo que lhes satisfaça, mas que, parece, nunca será encontrado.

Tomara que a iniciativa do Guiti inspire outros a seguir o mesmo caminho. O resultado é ótimo. Confiram!

(Meus alunos estão produzindo algumas fotonovelas, baseadas em obras literárias. De acordo com a possibilidade e com a vontade deles, vou colocar esse material no ar).

sexta-feira, setembro 01, 2006

[ sapatos bicolores ]

Uma das melhores coisas da Internet é poder reencontrar amigos. Mais do que isso, é poder descobrir que um antigo amigo está com uma banda maravilhosa. Pois acessando o Ranchocarne, encontrei uma referência do Galera ao André Vasquez. Fiquei intrigado: seria o mesmo ex-vocalista da Pão de Queijo & Os Mortadela? Esse super power trio fazia um rockabilly fantástico na mesma época que eu tocava com os Galãs da Menopausa. O Vasquez cantava muito e debulhava a guitarra. Agora descubro que ele é o homem que está por trás da Sapatos Bicolores. Já baixei tudo: agora só preciso de um tempinho sem nada pra fazer pra poder escutar cada música com calma (porque rapidamente já deu pra perceber que o som é ótimo). E tempo está como dinheiro: curto, curto... Mas é isso: acessem e baixem as músicas dos caras, porque certamente vale a pena. Aliás, devo confessar que acho que o Vasquez tem tudo pra ser o melhor vocalista de rock do Brasil. É só esperar pra ver...

(Ah, quanto aos Galãs, em breve colocaremos no ar um site com o Baú da banda. Aguardem...)

Pós-escrito: 4/9/6 - 21h
Pois é... Eu sabia que o André estava morando em Brasília já há uns cinco anos, mas o mundo é mesmo pequeno... Meu pai disse que o André é o namorado de uma sobrinha de minha madrasta. Bom, baixem o som dos caras. Não é porque é da família, mas vale... hehehe...

quarta-feira, agosto 30, 2006

[ você está demitido! ]

Ontem assisti pela primeira vez ao programa O Aprendiz, da Record, comandado pelo Roberto Justus. Confesso que fiquei encantado. É interessantíssimo como ele exige de seus aprendizes: qualquer deslize é percebido, seja na criação de uma campanha, seja na expressão oral.

O que o Justus mostra ali é a importância que tem não apenas o estudo especializado, mas também a cultura, a informação e o domínio de línguas. Ontem, quando uma das participantes utilizou uma regência errada, ele foi implacável: "o que não pode é a língua portuguesa ser assassinada desse jeito nesta sala!"

O prêmio para o vencedor é de 500 mil reais para um contrato de trabalho de um ano na sede de uma das empresas de Justus em Nova York. Se o candidato não domina nem a própria língua, será que ele domina o inglês e terá condições de enfrentar o desafio após ganhar o jogo?

O prêmio para os vencedores da etapa apresentada ontem pela tv foi uma viagem a Punta Del Este, com direito a passeios e visita à casa de um pintor uruguaio. Além de Justus dominar o seu trabalho, ele também entende muito de arte, domina as línguas que fala e está sempre bem informado. A meu ver, é disso que o Brasil precisa, de pessoas preparadas dessa forma para encarar os desafios do mundo. Mais do que isso: com mais cultura teremos menos violência e corrupção, além daquilo que é óbvio: teremos menos burrice também.

terça-feira, agosto 29, 2006

[ barba verde ]

Alguns candidatos vão longe quando querem chamar a atenção do eleitor. Ontem, vi no programa eleitoral um candidato a deputado estadual que tinha metade da cabeça e da barba completamente raspadas, enquanto a outra metade estava coberta por um monte de pêlos brancos... Pena que não gravei o nome do candidato, mas ele era do PSDB.

O também candidato a deputado estadual Di Martino, do Prona, acha que consegue fazer mais estardalhaço ficando de costas e caminhando na frente da câmera, tentando dar a idéia de que não vai ignorar o eleitor.

Mas essa foi demais: ontem também, durante o debate da Band, o candidato a governador pelo PV, Edison Pereira (na foto acima), estava com o cavanhaque pintado de verde! Se eu fosse o presidente desse partido, ele estaria banido na hora. Um partido político precisa de candidatos alfabetizados, que saibam se expressar e que tenham senso estético. Claro, além de serem, obrigatoriamente, honestos, mas essa é a parte mais difícil, pelo menos no Brasil.

O fato é que um candidato precisa passar segurança pro eleitor. E poucos conseguem fazer isso. Os partidos, por sua vez, aceitam qualquer um que tenha dinheiro pra investir na campanha, sem se preocupar com as suas idéias. Preocupação quanto à expressão do candidato, então, está longe das idéias dos dirigentes...

Provavelmente, o partido com maior número de candidatos claramente despreparados para assumir um mandato em qualquer instância é o PP. São raros os candidatos que sabem se colocar diante das câmeras, e a candidata ao Senado pelo partido, Monica Leal, mais parece uma socialite que caiu de pára-quedas na política. Isso prejudica a imagem de um candidato a governador, no caso, o Francisco Turra.

Eu não sei bem em quem votar. Alguns de meus votos serão nulos, com convicção e consciência. Mas eu já sei em quem não vou votar...

quarta-feira, agosto 23, 2006

[ + hamlet ]


Hamlet está saindo de cartaz no próximo fim de semana. Parece que semana que vem, dias 30 e 31, os alunos da UFRGS poderão assistir à peça por míseros R$ 5,00, com ingressos sendo vendidos a partir do dia 28/08. Não percam!

terça-feira, agosto 15, 2006

[ ey, ey, eymael!!! ]

Propaganda política começando na TV é garantia de diversão!

Na sua primeira exibição, apresentada hoje às 13h, o programa do candidato pelo PSDC, José Maria Eymael, tinha a palavra "empobresse" em sua legenda. Pelo menos isso foi corrigido para o programa recém exibido, às 20h30min. Mas manteve outro erro grave: "mais" ao invés de "mas"... Mas mais divertido foi ver uma jornalista do programa pluralizar o número 145: "cento e quarenta e cincos". Hehehehe...

Vem cá, os candidatos não tinham de fazer um teste de Língua Portuguesa e conhecimentos gerais? Tudo bem, provavelmente não foi ele quem escreveu o texto, mas é a imagem dele que está em jogo. Eu não voto (mais) em candidato que não fala e não escreve corretamente. Pô, se ele não domina a Língua Portuguesa, o mínimo que ele podia fazer era contratar revisores com boa formação... Se precisar, eu cobro baratinho... Hehehehe...

domingo, agosto 06, 2006

[ hamlet ]

Hamlet é a peça mais famosa de William Shakespeare, mas isso não impede que a montagem dirigida por Luciano Alabarse seja a primeira com texto integral realizada no Rio Grande do Sul. A peça fez sua estréia no início de julho no Theatro São Pedro e agora retornou no palco do Renascença. Com ingressos a R$ 20,00 (e 50% de desconto para estudantes, professores e maiores de 60 anos), ninguém pode deixar de assisti-la.

O texto tem tradução de Lawrence Flores Pereira, professor da UFSM, e dramaturgia de Kathrin Rosenfield, professora da UFRGS. É provável que Alabarse teria conseguido o mesmo resultado sem esse apoio, por mais importante que tenha sido, mas talvez isso levasse a peça a gestar por mais tempo. De qualquer forma, quem assiste à produção tem a nítida noção de que se existissem mais nove diretores como Luciano Alabarse no teatro gaúcho, seríamos referência na área para todo país.

O problema do teatro gaúcho é que os atores e diretores acreditam que só conseguirão sobreviver montando espetáculos infantis ou comédias non-sense e o tradicional pastelão. Alabarse provou, com a curta tempoarada no São Pedro, que não é necessário ser engraçado para ter a casa cheia. Eu mesmo tentei assitir à estréia, mas quando cheguei para comprar o ingresso era tarde demais.

Não estou dizendo que não é bom existirem comédias. O problema aqui no Rio Grande do Sul é que elas dominam o teatro gaúcho, e o pior é que são todas parecidas, recheadas de clichês que todos já vimos em seriados como Seinfeld, Sex and the city e Friends, ou mesmo n'A Grande Família, n'Os Normais e em Sexo Frágil. Até os títulos dessas peças remetem a essas séries: Manual Prático da Mulher Moderna, Se meu ponto G falasse, Homens de perto... As montagens não são ruins, os atores são alguns dos melhores que fazem teatro por aqui, mas faltam no teatro gaúcho diretores que ousem, que criem obras consistentes, que montem clássicos e peças modernas (mas sem essa história de minimalismo ou pós-modernidade, por favor).

Alabarse não é o único a desenvolver um teatro de qualidade. Temos Ramiro Silveira, Roberto Oliveira, Patrícia Fagundes, entre outros poucos. Mas a direção executada em Hamlet é a melhor dos últimos anos. A peça conta com mais de 20 atores, e vários deles participam da orquestra de panelas que executa a trilha sonora ao vivo, remetendo à música popular da época em que a peça foi escrita (entre 1600 e 1602 e impressa pela primeira vez em 1603). Cada detalhe da montagem parece ter sido minuciosamente trabalhado, desde um simples gesto de um personagem coadjuvante até o cenário limpo, sem cortinas, que permite ao público visualizar a preparação de cada ator antes de entrar em cena.

Além da ótima direção, os atores captaram muito bem a alma de cada personagem da tragédia. Ida Celina transmite exemplarmente as dúvidas da Rainha Gertrudes, Carlos Cunha Filho encarna um Rei Claudio cheio de ironia e perturbações, José Baldissera é um Polônio patético, engraçado, mas também triste, tudo na medida certa. Mas as grandes atuações ficam mesmo para Evandro Soldatelli (na foto acima) e Ekin, que vivem Hamlet e Ofélia, respectivamente. O pudor, no início, e a loucura, depois, são os elementos básicos de Ofélia, reconhecidos por Ekin com maestria. Não é à toa que é um dos personagens mais difíceis de Shakespeare, considerado um enigma por centenas de atores, diretores e dramaturgos. E Soldatelli é um Hamlet debochado, irônico, louco, desesperado. Sua interpretação acompanha de maneira exata os altos e baixos do príncipe da Dinamarca. Mais do que um desafio, Soldatelli parece ter recebido a proposta de interpretá-lo como um presente.

Mas presente mesmo é o que esta montagem oferece ao público. Assistindo a uma boa encenação de uma peça cheia de traições, mortes e reviravoltas, é inevitável associá-la ao que estamos presenciando nos noticiários. Hamlet nos ajuda a refletir sobre a situação política do país e do mundo. Só nos resta esperar que mais diretores tenham coragem e ousadia para montar mais Shakespeare, mas também Beckett, Ibsen, Nelson Rodrigues...

(E não se esqueçam, a temporada de Hamlet, que tem quase três horas de duração com um intervalo de dez minutos, vai até o dia 27 de agosto, no Renascença. Sextas e Sábados às 21h, e Domingos às 18h. O Renascença tem estacionamento próprio. Não percam!)

sexta-feira, agosto 04, 2006

[ mãos de cavalo ]

Resolvi adotar o novo livro do Daniel Galera, Mãos de Cavalo, com meus alunos do 1º ano do Santa Inês. E fiz isso por vários motivos.

Em primeiro lugar, o livro é ótimo. Não quero ficar fazendo propaganda demais, porque depois o pessoal pode se decepcionar, mas ele está sendo super festejado pela crítica. O Galera, que também tem um blog (ranchocarne), conseguiu criar uma história sensível e bem bolada. Os personagens são palpáveis, a trama é realista e as descrições e os detalhes não são desnecessários.

Em segundo, apesar de ser paulista, o Galera viveu a maior parte de sua vida aqui em Porto Alegre. O cenário do livro é Porto Alegre e os personagens conjugam a segunda pessoa com o verbo na terceira. Essa conjugação verbal, que tem sido vista por parte da crítica como um ponto negativo, está de total acordo com as idéias do meu professor Paulo Guedes. Tenho a impressão, inclusive, de que o Galera também foi seu aluno ou, pelo menos, teve contato com seus textos através do professor Paulo Seben. Não estou levantando a bandeira do separatismo nem dizendo que é bom ser gaúcho. Na realidade, o Galera até avacalha com algumas paisagens porto-alegrenses. O que ele demonstra, dessa forma, é que fica artificial retratar uma história sem apresentar os hábitos e a realidade do espaço.

Por último, o 1º ano do Santa Inês tem um projeto que se chama "Cidadão Responsável". O objetivo do projeto é fazer com que os alunos percebam as responsabilidades que eles devem começar a encarar a partir de agora. Afinal, é balela esse papo de que o professor prepara seus alunos pro futuro ou pra vida, pois eles já estão vivos e vivendo. E a história que o Galera construiu, alternando momentos do protagonista entre os seus 10, 15 e 30 anos, faz com que cada um reflita sobre a sua própria posição nessas idades e sobre os objetivos que gostaria de alcançar em cada década de existência.

O livro deve ser lido por qualquer um, porque é de uma excelência literária pouco comum na literatura brasileira contemporânea. Como alguns estão dizendo por aí, o Galera deixou de ser uma simples promessa. Quem quiser conferir seu primeiro livro, Dentes Guardados, pode clicar no link aí para baixá-lo gratuitamente. Depois eu conto como foi a reação dos alunos...

[ 7 motivos para um professor criar um blog ]

Este texto acerta em cheio sobre alguns dos motivos que me levaram a ter um blog novamente.

segunda-feira, julho 31, 2006

[ autoria ]

Já é uma aula apenas o texto de divulgação deste curso, ministrado pelo excelente professor Paulo Guedes. Quem nunca teve aula com o Paulo não pode perder.

AUTORIA: PARA APRENDER A ENSINAR-SE A ESCREVER

AUTORIA quer formar AUTORES: AUTOR é quem está mais interessado em conhecer do que em registrar o que já conhece; escrever para o AUTOR é apropriar-se de um conhecimento que está sendo produzido no próprio processo de escrever. AUTOR é quem, em vez de impor um conteúdo ao texto que está escrevendo, dialoga com o texto que está escrevendo: interroga-o a respeito do que ainda não descobriram juntos, do que não ficou esclarecido e que ainda precisa ser escrito. AUTOR é quem - em vez de impor uma fôrma ao texto que está escrevendo - consulta-o a respeito da melhor maneira de organizar o que estão, juntos, tentando dizer para o leitor. AUTOR é quem, a cada texto que escreve, ensina-se a escrever o texto que está escrevendo.

Aprender a escrever é desenvolver o domínio dos recursos expressivos da língua escrita para escrevermos o que a gente precisa escrever. E o que a gente precisa escrever é a peculiar e pessoalíssima leitura que cada um de nós faz do mundo e dos livros. Escrever a leitura que fazemos do mundo e dos livros não é nem um dom divino, nem um talento especial, nem um privilégio genético. É uma habilidade ao alcance de todos os que dispuserem a desenvolvê-la. A história da escrita nada mais é do que a história da democratização do uso da escrita.

Para escrever a leitura que fazemos do mundo e dos livros é preciso dialogar insubmissa e construtivamente com o mundo, e o mundo é o outro, o mundo é o leitor. O mundo é a linguagem com que fomos desde sempre interpretados pelo outro, com que interpretamos o outro e com que nos interpretamos. Para escrever a leitura que fazemos do mundo e dos livros é preciso dialogar com os livros, e os livros são os outros, são a cultura, são a língua que inventamos para botar por escrito a língua em que falamos o mundo.

Escrever é uma habilidade que, como qualquer outra habilidade, desenvolve-se com a prática e com a reflexão sobre essa prática; assim sendo, escrever, ler, ser lido, discutir os próprios textos e outros textos produzidos a respeito dos mesmos temas, reescrever essas versões iniciais a partir dos palpites desses leitores - os colegas e o professor - são as atividades básicas do curso AUTORIA.

Quem vai dar o curso é Paulo Coimbra Guedes, professor aposentado do Instituto de Letras da UFRGS, onde o que mais fez foi ensinar a escrever no Curso de Comunicação Social e no de Letras, onde também ensinou a ensinar a escrever. É autor, entre outras coisas, de um romance chamado Tratado geral da reunião dançante e de um manual de redação chamado Da redação escolar ao texto.

As aulas vão ser dadas nas quintas-feiras - uma turma à tarde das 14:00h às 17:00h e outra à noite das 19:00h às 22:00h - no Centro de Meditação e Bioenergética Namastê, que fica na Rua da República, nº 528. O investimento é de R$ 500,00 em uma parcela ou em quatro parcelas mensais de R$ 140,00. Maiores informações pelo email pcguedes arroba click21.com.br ou pelo telefone (51) 8179 0415.

domingo, julho 30, 2006

[ belle & sebastian ]


Tenho escutado poucos artistas novos interessantes. A maioria das novas bandas está se repetindo ou repetindo o que outros já fizeram. Quando descobri o Wilco senti que ainda havia uma alternativa. Mas desde então não encontrei mais nada que despertasse meu interesse e que merecesse meu dinheiro. Eis que o Belle & Sebastian lança um novo álbum. Sempre gostei dessa banda inglesa, mas parei de escutá-la com regularidade. The Life Pursuit é um disco muito diferente dos anteriores da banda. Estão ali as baladas tranqüilas que fizeram o sucesso desses ingleses, mas também uma série de canções que são completamente distintas de tudo que eles fizeram e de tudo que está tocando por aí. Há flertes com o blues, com o pop tradicional, mas também uma série de experimentações que só quem tem ouvido fino conseguiria executar. Destaco Funny Little Frog, Act Of The Apostle Part 1 e Act Of The Apostle Part 2 e o super rock The Blues are Still Blue. Ainda bem que existe Belle & Sebastian... Vocês também podem conferir a rádio do selo deles, no link Jeepster Radio. Sejam felizes!

quinta-feira, julho 27, 2006

[ poa em cena ]

O site do Porto Alegre em Cena já está com a programação deste ano! Tenho a impressão de que essa lista ainda pode ser alterada, mas já temos várias boas opções para conferir.

Em primeiro lugar, destaco a montagem do Celso Frateschi para o Ricardo III, de William Shakespeare. Depois, Thon Pain Lady Grey, do Felipe Hirsch, diretor elogiadíssimo pela adaptação de Alta Fidelidade, do Nick Hornby. Mais: Leitor por Horas, direção de Christiane Jatahy, A Gota D’Água - Breviário, direção e roteiro de Heron Coelho e Georgette Fadel para a peça do Paulo Pontes e do sempre excelente Chico Buarque, e Daqui a Duzentos Anos, textos de Anton Tchekhov com direção de Marcio de Abreu e que tem no elenco o grande Luís Melo.

(Por enquanto, nada do Dinheiro Grátis, do multimídia Michel Melamed. Mas de repente estão trabalhando nisso. Depois eu comento essa peça que tive a oportunidade de assistir no Rio.)

O Em Cena rola entre 5 e 17 de setembro. Nos vemos nas peças e no ponto de encontro.

[ tradicionalismo II ]

Tradicionalismo - Paranaenses seguem norma

O Paraná é um estado mais tradicionalista do que o próprio Rio Grande do Sul. Essa é ótima...

[ tradicionalismo ]

Tradicionalismo - MTG aperta o cerco contra a Tchê Music - manchete da Zero Hora.

Os meus alunos do ano passado me acusavam de ser paulista, porque eu reclamava que os CTGs (Centros de Tradições Gauchescas) eram instituições que, na realidade, exploravam as tradições gauchescas, ao invés de preservá-las. Isso tem ficado cada vez mais claro pra mim.

Esse movimento dos CTGs começou na década de 1940. Hoje, existem quase 1500 CTGs no Rio Grande do Sul e muitos outros espalhados pelo mundo (outro dia um amigo me deu a notícia de um situado no Japão). Para aqueles que acham que o RS é o melhor estado do Brasil e que Porto Alegre é a melhor cidade do mundo, isso é muito bom, mas só comprova que essas pessoas viajaram pouco.

No fundo, quem comanda os CTGs são pessoas que não tiveram contato com a cultura gaúcha, pelo menos não como afirmam. O patrão do CTG 35, famosa churrascaria e casa de shows da capital (ao lado do Bourbon Ipiranga), nasceu no Partenon, um dos bairros mais urbanos de Porto Alegre. Pergunta pra ele se ele sabe domar um potro...

Eu gosto muito das tradições gauchescas, mas não preciso ficar exaltando isso como se fosse a última maravilha do mundo. Adoro churrasco, adoro chimarrão, gosto de algumas músicas do cancioneiro gaúcho e considero a literatura gaúcha fundamental para a compreensão do regionalismo literário brasileiro.

A verdade é que o MTG (Movimento Tradicionalista Gaúcho) está lutando contra algo que eles também praticam. A Tchê Music explora as tradições gauchescas da mesma maneira que os CTGs. Ambos são movimentos culturais idealizados para turistas. Enquanto ninguém der um basta nesse pitoresco, continuaremos sendo caricarutas de nós mesmos e continuarão a nos retratar de maneira exótica no cinema e na televisão. A respeito disso, sugiro conferir o excelente ensaio do Vitor Ramil, A Estética do Frio.

segunda-feira, julho 24, 2006

[ guerra ]

Para compreender melhor o conflito no Líbano: Paradise Now.

Tudo tem um início e um sentido: nada é gratuito. Assistam (disponível em dvd).

sábado, julho 22, 2006

[ o retorno ]

Durante alguns anos fiquei recluso dos blogs. Estava cansado, sentia que era tudo uma perda de tempo e abandonei definitivamente esse universo. Nos últimos meses, senti uma certa necessidade de voltar a escrever sem preocupações algo que me desse prazer. Além de querer expor algumas reflexões sobre livros, filmes, bandas e peças teatrais, sinto vontade de pensar a educação.

Manter um blog é uma questão de objetivos. Não faz sentido ter uma ferramenta como essa só porque está na moda ou pra agradar os amigos. Mas não vou ficar elencando os meus objetivos. Cada um que cuide dos seus.

Escrever é uma forma de se conhecer, de tentar compreender o que se pensa, de tentar organizar as idéias. Não é verdade que não escreve bem quem pensa de forma desorganizada. Então, sejam bem vindos à minha desorganização mental...